quarta-feira, 8 de abril de 2009

Crítica de quadrinhos: Y: The Last Man

Há um ano mais ou menos eu li as primeiras quatro coletâneas de Y: The Last Man, publicadas pelo selo Vertigo da DC Comics. Por falta de tempo, acabei não lendo as demais. Agora, de uma tacada só, comprei e li as seis coletâneas restantes, perfazendo 60 números dessa revista em quadrinhos que acabou ano passado.

As 10 coletâneas contam um grande arco de uma única estória, sobre o último homem sobre a Terra. Não, não é o último humano sobre a Terra mas sim, de verdade, o único ser com o cromossomo Y sobre a Terra. Na verdade, tratam-se de dois seres assim: Yorick Brown, um rapaz de 22 anos e seu macaco capuchinho Ampersand (ampersand é o símbolo &, para quem não sabe). 

Logo nas primeiras página do primeiro número, uma praga dizima todos os homens, deixando apenas Yorick e Ampersand para desfrutarem da mulherada ávida por sexo que os cerca. Não, não. A estória não é idiota assim, estava apenas brincando. 

Ao contrário, a premissa é séria e muito interessante. Yorick é um rapaz imaturo mas inteligente, mágico amador (um "escape artist") que não consegue falar nada sem citar alguma referência da cultura "pop",  e que é perdidamente apaixonado por sua namorada Beth, que está passando uma temporada na Austrália no momento em que os homens são mortos por uma ameaça invisível. Yorick, então, é levado por uma agente secreta negra, chamada apenas de 355,  juntamente com a geneticista Allison Mann em uma fuga pelos Estados Unidos (e pelo mundo), para procurarem a cura do problema. Yorick, por outro lado, tem seu próprio objetivo, que é achar Beth.

No meio do caminho, eles encontram Amazonas, lésbicas, ninjas, cowgirls, o exército israelense, agentes inimigos, astronautas, cientistas e tudo mais o que se pode imaginar. O mundo em que Yorick vive, agora, é dominado pelas mulheres e muita coisa mudou. Muita coisa mesmo. 

Brian K. Vaughan, o roteirista e criador da série, deve ter feito uma inacreditável pesquisa para escrever Y: The Last Man. Ele deixa claro o que falharia, o que continuaria funcionando e o que melhoraria se, subitamente, todos os homens desaparecem, deixando as mulheres comandando o mundo. Por exemplo, aparentemente, a única marinha que aceita mulheres em submarinos é a marinha da Austrália e, por causa disso, na situação calamitosa descrita nos quadrinhos, elas se tornariam as rainhas dos sete mares. 

Mas, na verdade, a praga é um McGuffin, ou seja, é apenas um artifício, algo que move os personagens no caminho de uma cura mas que, na verdade, o mais importante é a jornada. Yorick amadurece a cada passo, aprende o que é o amor verdadeiro, descobre a dor profunda, vai de um suicida a um herói. 355, uma máquina de matar, descobre seu lado "mulher" e passa a apreciá-lo. Hero, a irmã de Yorick (reparem nos nomes Shakespearianos dos personagens) se deixa levar para o "lado negro" mas luta para se redimir. A Dra. Allison Mann, que se acha culpada pela praga, aprende que o mundo não gira em volta dela. É, sem dúvida, uma estória de crescimento, superação e auto-descoberta como poucas, pontilhada, claro, de memoráveis cenas de ação e excelentes piadas. As brincadeiras de Yorick com a cultura "pop" são impagáveis e têm que ser lidas umas três vezes cada para se apreciar inteiramente a inteligência do texto.

O desenho de Pia Guerra é simples e, ao mesmo tempo, detalhado. Ela não tenta ser uma artista radical abstrata nem uma realista ao extremo. Vemos que a preocupação é com os traços dos rostos, com as expressões, com modificações muito sutis - mas ao mesmo tempo sensíveis - de um quadro para outro. Às vezes, até dá para achar que os desenhos são simplórios demais mas, no "grande esquema das coisas", eles funcionam maravilhosamente bem.

Como nem tudo é perfeito, dois problemas me fizeram perder a atenção durante a série. O primeiro deles não é exatamente um problema (não para mim) mas certamente contribui para dar um tom um pouco artificial à estória: todas as mulheres são lindas e maravilhosas nessa série, sejam elas "do bem" ou "do mal", novas ou velhas. Não tem nenhuma mulher feia, gorda, flácida e, quando alguém com uma forma inferior à de uma top model aparece, ela não é definitivamente feia e, além do mais, aparece muito pouco.

O outro problema que lá pelo oitavo volume começa a cansar de verdade é a quantidade de vezes que os personagens principais se ferem, passam por intervenções cirúrgicas das mais variadas, e saem serelepes alguns instantes depois. A repetição dos eventos é para lá de irritante mas a série como um todo é tão boa que dá perfeitamente para perdoar essa overdose.

É uma pena que acabou. Mas Brian K. Vaughan, autor ainda da excelente graphic novel Pride of Baghdad e de outra série que quero muito ler (Ex Machina), certamente ainda tem muito a contribuir para o mundo dos quadrinhos. Que venham novas obras!

Nota: 9 de 10

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