quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Crítica de filme: Tropa de Elite 2 - O Inimigo Agora é Outro

Tropa de Elite 2, assim como o primeiro, é um filme que precisa ser analisado em dois níveis. Tendo em vista que seu lançamento foi um sucesso, já sendo o primeiro lugar desse ano com boas chances de ultrapassar a maior bilheteria do país em todos os tempos (que é Dona Flor e Seus Dois Maridos), muito pouca coisa que eu escrevo já não foi dita por aí.

Mas vamos lá mesmo assim.

Como disse, TdE2 é um filme que precisa ser visto em dois níveis. O primeiro é o nível da catarse, sendo esse o nível mais discutido e mais presente em nosso dia-a-dia. Esse é o nível que, também, ajuda a nublar completamente o segundo nível, ao ponto que nos esquecemos dele: o nível técnico.

Dessa forma, no nível catarse, o filme é quase perfeito. Temos o agora Tenente-Coronel Nascimento (Wagner Moura) “botando para quebrar”, literalmente falando todas as verdades que ficam entaladas na goela de nós brasileiros, especialmente os cariocas, sobre os mandos e desmandos políticos do Brasil, com foco no Rio de Janeiro. Junte-se a isso a pancadaria física em um político. Só não fica melhor – e daí eu dizer que é o nível catarse é “quase perfeito” – por que Nascimento não esbofeteia mais políticos. Senti enorme falta disso para lavar minha alma de vez.

Ainda nesse nível, vemos um pouquinho da sujeirada política que arrasa nosso país, com corrupção pequena, de poucos Reais, até campanhas políticas milionárias com dinheiro de sangue e drogas. Ao passo que o primeiro Tropa tinha sua mira apontada no usuário de drogas playboy da Zona Sul do Rio de Janeiro, esse muda a bateria anti-aérea para os políticos que se beneficiam da total desobediência a quaisquer regras. Em meu entendimento pessoal e eu tentei mas não consegui deixar isso de fora de meus comentários, os usuários de drogas são os grandes culpados da situação calamitosa do Rio de Janeiro pois, sem eles, haveria muito mais controle da situação, com menos dinheiro rolando na mão de criminosos. Não consigo entender a política do Brasil de somente bater na mão desse pessoalzinho completamente sem noção, que deveria estar jogado às traças em prisões.

De quebra, o diretor José Padilha ainda tem tempo para descer o malho, ainda que de maneira mais leve, nos defensores dos direitos humanos, outro grupo que eu reputo completamente odioso, juntamente com o pessoal que defende de maneira cega o meio ambiente. Basta um preso violento ser agredido por um policial para o policial ser crucificado pelo pessoal dos “direitos humanos”, que passa a vida achando que tudo se resolve na conversa. Vejam se a Itália reduziu drasticamente a influência da máfia naquele país na base do papinho. Vejam se Nova Iorque passou de cidade extremamente perigosa na década de 70 para um exemplo de tranquilidade por que os políticos ficaram afagando bandido. Quem acha que foi assim é um completo iludido que realmente acha que vive no País das Maravilhas.

Ou seja, no nível catarse, Tropa de Elite 2 é um filme sensacional, que merece ser aplaudido de pé e ter todo o sucesso possível.

Já no segundo nível, o técnico, o filme não é lá muito bom. Mas antes que vocês me xinguem, primeiro vejam que a nota que dei ao filme foi bem alta e, segundo, leiam o que tenho a dizer.

O primeiro Tropa de Elite tinha um gravíssimo defeito: personagens demais e estórias paralelas demais que diluíram e fragmentaram o filme, tornando bem difícil seu acompanhamento. O filme tentou ser ao mesmo tempo a estória dos novos recrutas da Tropa, dos usuários de drogas e do Capitão Nascimento e acabou não conseguindo ser verdadeiramente nenhuma dessas coisas. Mas, assim como o segundo, o nível catarse do primeiro Tropa é também excelente, o que compensou os problemas.

O segundo Tropa resolve até certo ponto essa fragmentação, concentrando-se no agora Tenente Coronel Nascimento, que alcança o cargo de Subsecretário de Segurança do Rio de Janeiro. E Padilha resolveu de maneira simples: apesar do filme se chamar Tropa de Elite 2, na verdade a estória é sobre Nascimento e não sobre a Tropa. Aliás, de Tropa o filme pouco tem pois mostra uma missão sem muita ênfase na operação em si.

O foco é na sujeirada política e na ascensão do incorruptível Nascimento, um ser completamente atípico em nosso país (infelizmente!). Ele é o narrador, personagem principal e tudo gira em volta dele, deixando a trama mais coesa. Vemos, logo no início, que o filme se passa, quase todo, em flashback, a partir de um atentado à vida de Nascimento. Até aí, muito bacana.

Acontece que o filme não tem um clímax verdadeiro. Ele simplesmente acaba e seu ponto alto acontece muito antes do fim. Não há, também, uma resolução propriamente dita, mas sim uma espécie de ponderação filosófica um tanto quanto “em cima do muro”, ou seja, bem diferente do que vinha sendo feito até então pelo diretor.

Outro ponto que me chamou a atenção e incomodou muito foi a ingenuidade de Nascimento, algo completamente fora de seu personagem. Nascimento é um guerreiro, extremamente experiente e sem dúvida um estrategista. Ele consegue acabar com o tráfico de drogas nas favelas, mas não prevê o surgimento das milícias. E pior: quando as milícias são esfregadas em sua cara, ele ainda duvida e duvida e duvida. Tudo bem que não atuar rapidamente contra os milicianos é algo necessário para a trama do filme se desenrolar, mas a crença na “burrice” de Nascimento vai somente até certo ponto sem que comece a se tornar uma situação engraçada. O personagem não foi criado com esse grau de ingenuidade e sua falta de percepção é algo completamente fora do caráter do personagem, o que detrai muito do filme.

Mais uma questão que foi tratada com descaso por Padilha foi o sucesso de Nascimento no fim do tráfico de drogas. Toda a “ação” acontece fora da tela, apenas na narrativa do personagem. Isso é compreensível pois o diretor não queria simplesmente repetir o filme anterior mas daí a não mostrar nenhuma operação antidrogas, é um exagero. O filme teria se beneficiado muito de menos narrativa – que é algo que permeia todo o filme, muitas vezes explicando exaustivamente o óbvio – e de mais ação “descerebrada”.

Em resumo: o filme é muito eficiente em dar vazão às denúncias e à tudo que sabemos e vemos mas que não podemos dizer sem impunidade mas, sob o ponto de vista cinematográfico, deixa a desejar.

Mais sobre o filme: IMDB.

Nota: 8 de 10

3 comentários:

  1. Concordo com você, comentário excelente. Mas não foi burrice, o Cap. Nascimento não acreditar nas milícias e é facilmente identificado no filme; a polícia, para ele, era em sua maioria incoruptível. Ele delata, no fim do filme que passara 21 anos de sua vida na polícia e não soube porque se entregara tanto a ela. Ele simplesmente acreditava piamente, que a maioria dos policiais, fossem como ele, e se negava a aceitar o contrário, até que esfreguem isso na cara dele. E isso é uma ação inerente ao ser humano. Principalmente na situação em que ele se encontrava; o trabalho se tornara seu refúgio e sua família. Você mesmo, se disserem que sua família é formada por traficantes, você não irá acreditar, até que veja. É natural, e o Cap. Nascimento é humano. E, é claro, como todo super herói, ele tem seus pontos fracos, e o dele era a ingenuidade de acreditar que todos - ou pelo menso 90% - da corporação fossem como ele! :) Pelo menos, foi o que entendi.
    Quanto ao enredo/personagens, é natural girar em volta do Cap. Nascimento, já que o primeiro ele também era o personagem principal (ou pelo menos o com maior foco), além do quê, os "principais" do primeiro filme, foram todos aniquilados... Acredito que se, houvesse um foco maior na tropa, o filme não seria tão humano ~ próximo à nossa realidade. O que faz com que os super heróis se tornem amados (homem aranha, super homem, batman, etc), são que todos eles - repare bem - têm uma parcela de humano com a qual o espectador é capaz de se identificar. Se não houvesse foco no cap. nascimento, duvido que seria esse sucesso, ia acabar-se por ser só mais um "documentário" sobre o tráfico, e o crime organizado. E o povo não vai ao cinema pra "ler jornal". É um filme, acredito que não tenha sido feito apenas para ser um sucesso, ele foi feito pra chocar, é claro, mas achei que foi uma solução muito boa para unir as duas coisas!
    Como já disse, é só uma opinião pessoal!
    Abraços, e continue o bom trabalho!

    Atenciosamente,

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  2. Pode ser, Bel. Sua análise é muito boa. Também acho que o Ten Coronel Nascimento, no filme, acha que, realmente, a maioria do pessoal é honesto mas isso até certo ponto. Em determinada cena SPOILER ele claramente desconfia de como seu ex-parceiro voltou ao BOPE. Fica evidente ali que ele sabe que há algo errado mas ele se trai ao não continuar a investigar. Nesse momento, achei que Padilha exagerou na (des)caracterização do personagem.

    Sobre o segundo pont, não há problema algum o filme girar em torno do Ten. Coronel Nascimento. Não acho isso um defeito do filme, mas sim sua qualidade pois permitiu maior coesão ao roteiro. Na verdade, o primeiro filme tem muito pouco dele.

    Obrigado por seu comentário e volte sempre!

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    Respostas
    1. Discordo. Apesar de centrar a trama no Nascimento, permitir aproximação ainda maior do público com esse personagem, quebra toda a premissa do primeiro filme em engajar um sucessor.

      De fato, André jamais deveria ter morrido. Pelo menos, não em cena. Era para este ou outro substituto treinado ter assumido o posto de líder.
      Entretanto, a interpretação de Wagner Moura popularizou-se tanto que não quiseram arriscar continuar cronologicamente.

      Portanto, Nascimento que era o reflexo direto do esquadrão, praticamente morre com o mesmo ao deixá-lo. O abandono de um sucessor como personagem importante reflete o mesmo. Puro pessimismo sem soluções práticas, vai contra o princípio natural de que tudo se renova.

      Logo, o personagem de Wagner Moura está praticamente sozinho contra o crime e querendo ou não a realidade (ponto de maior preocupação do filme) não permite que um sozinho vença sua sociedade.

      O filme centrou demais nos dramas pessoais de Nascimento e abandonou a proposta do primeiro filme: Um esquadrão puro e forte. Como você se referiu o tenente coronel ficou meio ingênuo DEMAIS. Não arranjou um substituto eficiente, nem procurou outras opções, assim como fechou os olhos à realidade.


      Felipe

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Pensem antes de escrever para escreverem algo com um mínimo de inteligência. Quando vocês escrevem idiotices, eu apenas me divirto e lembro de Mark Twain, que sabiamente disse "Devemos ser gratos aos idiotas. Sem eles, o resto de nós não seria bem sucedido."