sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Crítica de filme: The Descendants (Os Descendentes)

No imaginário popular, o Havaí, assim talvez como o próprio Rio de Janeiro, é o paraíso na Terra. Praias lindas, vegetação insuperável, vulcões folclóricos e uma população que não faz nada da vida a não ser andar de chinelo, com camisas coloridas e colares de flores no pescoço e um sorriso no rosto. Alexander Payne, o diretor e co-roteirista de Os Descendentes, faz questão de destruir esse mito havaiano logo na abertura do filme e isso quase já vale o preço do ingresso.


Ouvimos a voz de George Clooney (Matt King) em narração em off, falando que morar no Havaí não é muito diferente do que morar em outro estado dos Estados Unidos e as imagens que vemos, escolhidas a dedo por Payne, ratificam a fala: vemos centros urbanos com os problemas inerentes a eles, população empobrecida e lugares menos "bonitos" do que esperaríamos. Não é uma jogada brilhante nem inédita mas a maneira simpática e jocosa com que o diretor consegue isso já dá o tom do filme, deixando claro que não veremos praias luxuriantes com havaianas lindas dançando hula-hula.

Mas Os Descendentes é bem mais do que seus momentos iniciais. O filme narra um momento muito especial - e triste - na vida de Matt King. Sua esposa, Elizabeth (Patricia Hastie), sofreu um acidente de esqui aquático e está em coma. Com isso, Matt vê sua vida ficar de pernas para o ar pois ele passa a ter que cuidar de suas duas filhas em tempo integral, algo que nunca fez. Além disso, ele é o advogado de sua família tratando da destinação de uma enorme propriedade virgem em uma das ilhas havaianas, que precisa ser vendida em razão do fim próximo de um trust formado pelos familiares (sua família é descendente do último rei nativo havaiano. E a cereja no bolo é a revelação, por sua filha mais velha (Alexandra, vivida por Shailene Woodley), que (SPOILER LEVE SE VOCÊ NÃO VIU O TRAILER DO FILME) sua esposa o traía com um desconhecido.

Os acontecimentos na vida de Matt o fazem refletir sobre a importância da família. Não só a sua diretamente (suas filhas e sua mulher) como, também, todos que estão a seu redor e que, de certa forma, dependem muito dele. Ele tem que entender e, em última análise, religar as conexões familiares que há muito perdeu. Essa temática, cadenciada pelos três acontecimentos acima e comandada por Alexander Payne (dos ótimos Sideways - Entre Umas e Outras e As Confissões de Schmidt), resultam em um filme muito agradável - apesar de triste - e especialmente pertinente nos dias de hoje.

E, talvez pela primeira vez, podemos ver o potencial da atuação de George Clooney. Desde que esse ator estabeleceu-se como galã do cinema (começando a fama na televisão, com E.R.), ele vem tentando desvencilhar-se dessa pecha e, eu diria, com muito sucesso. Provou ser um grande diretor (um exemplo recente é seu filme Tudo Pelo Poder) e provou que sabe escolher papéis relevantes (em Syriana e Queime Depois de Ler, dentre outros). No entanto, ele nunca havia feito, pelo menos no meu entender, um papel em que ele se despisse completamente de sua condição original de galã. Os Descendentes é o primeiro filme dele nessa linha e devo dizer que, com isso, ele mostrou sua versatilidade.

Vejam por exemplo o momento em que Alexandra faz a revelação "chave" para o pai. A reação de Clooney impressiona e, a partir dali, o personagem atinge convincentemente o fundo do poço para, claro, reerguer-se mais para a frente mas sem tornar essa curva artificial ou melodramática. O roteiro ajuda, claro, mas Clooney carrega o filme nas costas, apesar do gabarito dos demais envolvidos (Shailene Woodley também merece grande destaque por sua bela atuação).

O que talvez tenha faltado no filme é um pouco mais de fechamento da estória. Tudo parece ser um pouco mais corrido do que deveria ser ao final, com tomadas de decisão complexas que, no entanto, não parecem complexas.

Os Descendentes concorre a cinco Oscar: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Diretor, Melhor Edição e Melhor Roteiro Adaptado.

Mais sobre o filme: IMDB, Rotten Tomatoes, Box Office Mojo e Filmow.

Nota: 8,5 de 10

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