quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Crítica de TV: Planet of the Apes - A Série Completa - 1974 (Planeta dos Macacos - A Série Completa - 1974) - Parte 6

Há que se dar algum prêmio de insistência e perseverância para a Fox. Ou, talvez, de falta de originalidade, não sei. Mas o fato é que, desde o final da década de 60 (em 1968 para ser exato) o estúdio não parou de lançar filmes passados no universo do Planeta dos Macacos. Tudo começou com o imbatível original de 1968, com talvez um dos finais mais surpreendentes do cinema e continuou com De Volta ao Planeta dos Macacos, de 1970, talvez uma das piores continuações já feitas. Daí em diante, foi de ano em ano: voltou à forma em 1971, com A Fuga do Planeta dos Macacos, caiu novamente - mas não muito - em 1972, com A Conquista do Planeta dos Macacos e terminou de forma minimamente competente em 1973, com A Batalha do Planeta dos Macacos. Mas "Batalha" só foi o fim temporário da franquia no cinema pois a série continuaria na televisão, logo no ano seguinte, com o singelo título "Planet of the Apes".

Eu me lembro viva e saudosamente de ter visto essa série mas, provavelmente, na verdade, eu só a vi em alguma reprise do SBT anos depois ou quando do lançamento de um ou mais dos 5 filmes formados pela junção de episódios dessa série no começo da década de 80. De toda forma, estava curioso para rever a série e tinha a mais absoluta certeza de que seria uma grande porcaria. Assim, antes de ver, fiquei feliz ao notar que só havia 14 episódios no total pois a série foi cancelada na metade da temporada, ainda em 1974 (foi ao ar nos EUA de setembro a novembro daquele ano), pois dizem que, por um erro estratégico da CBS, ela foi lançada em direta competição com duas das mais assistidas séries da época da concorrente NBC: Sanford and Son e Chico and the Man.

Mas aí eu comecei a assistir e notei que, apesar do previsível baixo orçamento e da estrutura de "fuga da semana", a série tinha roteiros mais sólidos do que poderia esperar. Em termos de estrutura básica, a série conta a estória de dois astronautas que viajam para a Terra no futuro (bem na linha do que acontece com Taylor no filme original) e, quando chegam, notam que o mundo está de cabeça para baixo, com os macacos como a classe regente e os humanos como seres inferiores. Os dois astronautas americanos, o Coronel Alan Virdon (Ron Harper) e o Major Peter Burke (James Naughton) logo se juntam a Galen (Roddy McDowall, claro), um jovem chimpanzé que simpatiza com eles e o três saem em fuga desesperada pelo planeta, com o gorila General Urko (Mark Lenard, o pai do Spock em Jornada nas Estrelas) e o Conselheiro Zaius (Booth Colman) ao encalço deles.

Enganam-se aqueles que acham que a série, apesar dos aspectos em comum que tem com os cinco filmes anteriores, é uma continuação direta deles. Na verdade, tecnicamente falando, ela não se encaixa nem no universo "normal" dos macacos (que acaba no final do segundo filme) nem na linha temporal paralela criada com a viagem de Cornelius e Zira para o passado em "Fuga". Para começar, o ano é 3.095, não 3.978. Mesmo assim, o Dr. Zaius faz menção, no primeiro episódio, a outro astronauta que teria vindo do passado também há 10 anos, ou seja, menciona diretamente Taylor, do primeiro filme. Mas como se estamos 900 anos antes dos acontecimentos do primeiro filme? Além disso, esse Zaius não tem o mesmo cargo do outro, o que me leva a crer que apenas o nome é igual mas os personagens são diferentes. Mais ainda, os humanos falam fluentemente na série e não são tratados de maneira tão selvagem pelos macacos, tendo permissão até para terem fazendas. Esse aspecto dos humanos até faria muito sentido com o final de "Batalha" mas acontece que há cachorros no planeta (eles não haviam sido extintos por uma praga?) e, além disso, Virdon e Burke em nenhum momento mencionam Taylor ou Brent, os astronautas das missões dos dois primeiros filmes ou mesmo a viagem ao passado de Cornelius e Zira.

Em outras palavras, tentar encaixar de verdade essa série nos filmes que vieram antes é uma tarefa árdua e que, tenho para mim, não dará frutos. Acontece que isso pouco importa para a apreciação do material.

O que importa são os roteiros e o carisma dos quatro personagens principais: Burke e Virdon como representantes da raça humana e Galen e Urko como representantes dos macacos.

Vamos começar pelos roteiros. Apesar de formuláicos, ou seja, seguirem o padrão de "fuga" ou "perigo da semana", algo que, aliás, era traço comum das séries de televisão das décadas de 70 e 80, os roteiros de Planeta dos Macacos são sólidos e muito bem construídos, com uma enorme variedade de assuntos. O primeiro episódio (Escape from Tomorrow) estabelece os detalhes básicos da série e é quase desnecessário para quem já está acostumado com a mitologia dos filmes que a precederam. Mas, passado o primeiro episódio, o que vemos em seguida é uma série de inteligentes embates entre civilizações.

O terceiro episódio, por exemplo, chamado The Trap (A Armadilha), coloca Burke e Urko presos em um buraco de metrô em uma São Francisco em ruínas e eles têm que trabalhar juntos para sair de lá, para o desgosto de ambos. Mas os roteiristas apimentam a "relação" e jogam com as personalidades dos personagens. Burke tem uma certa vaidade maldosa de colocar sal na ferida de Urko ao dar vários exemplos de como os humanos são melhores do que os macacos. Por outro lado, Urko recusa-se a cooperar enquanto Burke não jure o contrário, mesmo com Urko claramente ciente de que Burke está certo (ele vê um poster na parede sobre o zoológico de SF com um gorila atrás das grades e humanos felizes vendo o bicho preso). Outro episódio, The Surgeon, coloca Burke e Galen tendo que furtar um livro de medicina humana de Zaius para ajudar uma doutora símia a relutantemente extrair uma bala de Virdon. Como funcionaria a ética médica símia?

Em um episódio que não foi ao ar na época devido à sua temática - The Liberator - um humano que finge ter poder de um deus, quer usar guerra química contra os símios e cabe aos nossos heróis impedir. E, apesar de a série não ter um fim, o último episódio, Up Above the World So High, aborda a questão da capacidade humana para inventar ao mostrar um dos humanos criando uma asa delta. Em outras palavras, os roteiristas deixam uma fresta aberta para concluirmos que os humanos, apesar das circunstâncias em que vivem, talvez, em algum momento, consigam viver em harmonia com os macacos ou até tornarem-se a raça dominante no planeta novamente.

Mas os episódios, todos de 49 minutos, são longos demais para sustentar as estórias que têm e poderiam facilmente ser podados, cada um, em 15 minutos. Ok, isso permite aos diretores trabalharem melhor os personagens mas, por outro lado, alguns episódios parecem ser longo demais, com longas e desnecessárias exposições. No entanto, apesar da minha certeza de que, depois dos cinco primeiros episódios, eu já não estaria aguentando mais, fato é que minha atenção ficou presa até o último minuto do 14º episódio.

Incomoda também o fato de que uma linha da narrativa simplesmente desaparece. No primeiro episódio, Virdon faz de tudo para recuperar um disco contendo dados importantes sobre a viagem dos dois para poder lê-lo em algum computador que ainda possa existir nesse mundo. Interessante a possibilidade mas esse disco é tratado no episódio seguinte mas, no terceiro, que ainda fala sobre ele no começo, ele é completamente esquecido e nunca mais mencionado a partir daí. Será que os roteiristas mudaram de ideia ou ainda tinham planos para essa linha narrativa? Bem, nunca saberemos.

Outra questão que depõe contra a série mas chega a ser engraçado de tão exagerado é o "fator MacGyver". Tudo bem que Virdon e Burke são astronautas e que, por isso, têm treinamento superior aos demais mortais e eu aceito que Virdon tenha vivido sua infância em uma fazenda mas daí a torná-los experts em tudo que existe é um pouco demais. Eles constroem de bússolas a asas deltas usando ferramentas rudimentares. Sabem arar e fazer o parto de vacas. Sabem como criar quinino, a cura da malária, tendo inclusive a capacidade de reconhecer a árvore que produz a substância. Sabem fazer exame de sangue para reconhecer o tipo sanguíneo de cada um. Sabem costurar como ninguém. Em suma, em um campeonato, MacGyver perderia feio para a dupla Virdon e Burke. Mas, como eu disse, é tão absurdo que é engraçado.

A série, porém, não seria a mesma coisa não fossem os atores. A interação de Virdon (Ron Harper) e Burke (James Naughton) é muito boa. Os dois atores parecem estar se divertindo muito mas apresentam seriedade quando é necessário. Mark Lenard como Urko é perfeito. Ele faz o malvado padrão mas de uma maneira tão simpática que é impossível não gostar ou às vezes até torcer pelo personagem. A expressão de frustração de Lenard a cada derrota para Virdon e Burke, mesmo através da pesada máscara de gorila, é impagável.

Mas a cereja no bolo é mesmo Roddy McDowall como Galen, provavelmente seu melhor papel símio. Na série, com o espaço que Galen tem, McDowall teve mais chances de mostrar sua versatilidade do que nos filmes, criando uma personalidade bem própria para o jovem chimpanzé. Galen não é um bobalhão que segue os humanos como se fossem dois deuses. Ele tem suas próprias crenças e, sempre que pode, dá umas boas alfinetadas nos amigos humanos. E, quando tem que se envolver na ação, Galen - McDowall na verdade - mostra uma versatilidade para se transformar em outros personagens que, novamente, me deixou surpreso. Mesmo sem a tecnologia atual com próteses (vide O Planeta dos Macacos de 2001) ou captura de performance (como no recentíssimo Planeta dos Macacos - A Origem), Galen, ao usar de subterfúgios para enganar seus pares, parece realmente que está mimetizando outros personagens. Talvez McDowall fosse mesmo um chimpanzé e estava apenas fingindo ser humano...

E a variedade dos macacos é outro ponto alto do filme. Apesar do baixíssimo orçamento da série, em que óbvias luvas peludas foram usada no lugar de próteses, o pouco de dinheiro que havia foi aparentemente empregado na variedade das máscaras dos macacos. Nem mesmo no primeiro filme vemos isso. Cada gorila tem suas características e isso é importante pois, com a introdução de vários personagens novos por capítulo, é importante que o espectador possa identificá-los rápida e facilmente, não só pelas roupas. E nisso a equipe de próteses caprichou.

E a trilha de Lalo Schifrin fecha meus comentários sobre os méritos da série. Schifrin, autor da música clássica de abertura da série Missão Impossível e das trilhas dos filmes de Dirty Harry, consegue, de maneira muito eficiente, criar uma trilha que lembra - sem copiar - a original de Jerry Goldsmith no filme O Planeta dos Macacos, de 1968. É dramática como a série exige mas, ao mesmo tempo agradável e memorável.

Só uma curiosidade para quem quiser saber o destino dos astronautas na série, já que a interrupção abrupta na produção não dá nem pistas disso. Em 1981, cinco telefilmes formados pela junção de 10 episódios da série, foram lançados. Quando a ABC os transmitiu, a TV contratou Roddy McDowall para viver um envelhecido Galen abrindo e fechando os filmes. Lá, Galen revela que Virdon e Burke acham finalmente um computador e desaparecem no espaço de forma tão repentina quanto haviam chegado. Não se pode dizer que isso faz parte da série pois foi feito pela ABC sem, aparentemente, um ok da Fox e não faz parte do DVD que assisti. De toda forma, pelo menos é um fechamento.

Depois de muita conversa, um resumo: essa série de TV é a melhor coisa feita com a mitologia dos macacos desde o primeiro filme e merece muito ser vista.

E quem acha que essa foi a única vez que os macacos foram para a TV, estão enganados. Daqui a pouco tem mais.

Mais sobre a série: IMDB, TV.com e Filmow.

Nota: 8 de 10

8 comentários:

  1. Você sabe aonde consigo baixar os episódios dessa série? Ou se vende em algum lugar?
    Muito obrigado.. sou um grande fã da mitologia dos macacos

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  2. Essa série é vendida na Amazon, aqui: http://www.amazon.com/Planet-Apes-Complete-Roddy-McDowall/dp/B000GUJZ0K/ref=sr_1_1?ie=UTF8&qid=1315331988&sr=8-1

    Mas, infelizmente, é em inglês com legendas opcionais em inglês. Não encontrei uma versão vendida no Brasil.

    É aquilo que eu escrevi: não é muito bem feita mas é muito divertida, com ótimos roteiros e simpáticos personagens. Se você é fã, vale o esforço para tentar adquiri-la.

    Espero ter ajudado.

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  3. Amigo, adorei sua crítica, pois é bastante coerente.

    E mesmo com os "furos" existentes na série, digo que foi a MELHOR série de tv a qual assisti na minha infância. Passando à frente até do Homem de Seis Milhões de Dólares, que também foi ótima.

    Além de tudo o que você disse, acho que o contexto nos passa uma mensagem muito interessante e bela sobre amizade e lealdade incondicionais entre o herói Galen, Alan e Pet.

    Obrigado pela crítica e abraços!

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  4. Oi!!! Muito legal o blog!!"!
    Fiquei curioso em assistir os "cinco telefilmes formados pela junção de 10 episódios da série transmitidos pela TV ABC"!!! Sabe onde posso conseguir?!

    Abraço!

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  5. Aos dois Anônimos:

    Obrigado pelos elogios e por prestigiarem meu blog.

    Concordo com a questão da mensagem de amizade e lealdade incondicionais. Realmente, isso fica evidente ao longo da série.

    Sobre a pergunta do segundo Anônimo, pelo que pesquisei, esses 5 telefilmes não estão disponíveis, pelo menos não legalmente. Uma pena!

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  6. Adorei a crítica. Concordo que os atores foram fundamentais. Aliás como sempre, Ron Harper dando um banho, como deu em Garrison´s Gorillas.

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  7. Adorei a crítica. Concordo que os atores foram fundamentais. Aliás como sempre, Ron Harper dando um banho, como deu em Garrison´s Gorillas.

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  8. Adorei a crítica. Concordo que os atores foram fundamentais. Aliás como sempre, Ron Harper dando um banho, como deu em Garrison´s Gorillas.

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Pensem antes de escrever para escreverem algo com um mínimo de inteligência. Quando vocês escrevem idiotices, eu apenas me divirto e lembro de Mark Twain, que sabiamente disse "Devemos ser gratos aos idiotas. Sem eles, o resto de nós não seria bem sucedido."