sábado, 24 de março de 2012

Crítica de filme: The Hunger Games (Jogos Vorazes)

A premissa de Jogos Vorazes é batida, mas só se você focar na superfície. É uma espécie de mistura entre The Running Man e Battle Royale já que coloca jovens se matando em uma arena para um emergir vitorioso. Acontece que Suzanne Collins, a autora do bestseller de 2008 de mesmo nome que foi adaptado ao cinema por ela própria junto com o co-roteirista e diretor Gary Ross, foi muito mais além do que uma competição sangrenta, imprimindo fortes mensagens anti-belicistas (na linha de "O Senhor das Moscas", de William Golding) e, principalmente, sobre o poder da manipulação dos meios de comunicação (lembrando fortemente o clássico "1984" de George Orwell).


Como a própria autora foi envolvida na criação do roteiro e Gary Ross (do razoável Sea Biscuit - Alma de Herói e do bom A Vida em Preto e Branco) quis manter-se fiel à mensagem da obra fonte, o que temos da tela é uma aventura dinâmica, muito bem adaptada ao cinema e que faz questão de tratar do assunto de maneira mais madura, fugindo da armadilha de "filmes de adolescente" (público-alvo do livro).

Em um futuro distópico, os Estados Unidos não mais existem e, em seu lugar, temos Panem, um país controlado com mão de ferro pela Capital, um rico centro cultural e tecnológico, que explora 12 Distritos mais empobrecidos. Há 74 anos, uma rebelião levou a Capital a esmagar o 13º Distrito e a criar os Jogos Vorazes como um lembrete de seu poder e da subjugação dos distritos. O jogo consiste em colocar 24 jovens tributos (um casal de cada distrito, entre 12 e 18 anos, escolhido em sorteio) uns contra os outros em uma enorme arena cheia de armadilhas controlada por um Game Master. É um vale tudo até a morte e o último a sobreviver ganha o jogo. Tudo, claro, devidamente televisionado para toda Panem.

O filme é focado em Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence), jovem do Distrito 12 que aprendeu a caçar com seu falecido pai, o que faz com seu amigo Gale Hawthorne (Liam Hemsworth), ainda que essa atividade seja criminosa. Em um ato de coragem, Katniss acaba indo aos jogos junto com Peeta Mellark (Josh Hutcherson), o tributo masculino de seu distrito. O mentor dos dois é Haymitch Abernathy (Woody Harrelson), um bêbado que já venceu um dos tais Jogos Vorazes. A partir daí, é a guerra pela sobrevivência.

Com uma direção muito segura, Gary Ross apresenta todos os elementos importantes da narrativa sem perder o ritmo, valendo-se, às vezes, de flashbacks sem diálogos, algo que acaba valorizando muito o filme, em vista do ar de seriedade que imprime. Com uma edição esperta (menos nas cenas das lutas, como comentarei mais abaixo), Ross consegue, ao mesmo tempo, passar a impressão de passagem temporal e um ritmo frenético, que não dá ao espectador muito tempo para pensar.

Mas é o roteiro que consegue se sobressair. Primeiro, ele condensa a estória do livro sem se esquecer dos aspectos mais importantes. Há várias modificações mas só aqueles fãs chatos do livro é que vão achá-las desrespeitosas. Personagens são inteiramente cortados da estória e outros tem seu destaque muito reduzido (como Gale, por exemplo) mas, se não fosse assim, o filme teria caído na armadilha de tentar reproduzir, não efetivamente adaptar uma estória.

Uma jogada brilhante do roteiro é a presença mais constante de elementos de ficção científica. Vemos não só hovercrafts futuristas e uma Capital extremamente moderna, elementos constantes no livro, como, também, participamos do controle dos Jogos diretamente da sala de "guerra", em que o Game Master Seneca Crane (Wes Bentley) e sua equipe determinam cada detalhe do que ocorre na arena. E esse personagem, que somente é mencionado no livro, é muito bem desenvolvido no filme, como um elemento para permitir a fluidez da narrativa. Todo esse desenvolvimento, acaba contribuindo para um final mais orgânico ao filme, que não cria estranheza como no livro.

Também para ajudar na narrativa temos os vários cortes para o apresentador Caesar Flickerman (Stanley Tucci), algo como o Pedro Bial desse universo, para literalmente explicar, sem parecer artificial, diversos acontecimentos nos jogos. Por exemplo, a explicação sobre as vespas geneticamente alteradas soaria forçada saindo da boca de qualquer personagem na arena mas, de Flickerman, a narrativa funciona muito bem. E o romance adolescente teve sua presença reduzida para a medida exata, tornando o personagem de Katniss ainda mais crível do que no livro.

No entanto, Gary Ross, certamente para evidenciar a questão da manipulação das imagens, mas também para dar um tom de documentário ao filme, escolheu usar a técnica de "câmera na mão". Devo dizer que me incomodei muito com a tremedeira constante, algo que não precisava ser tão presente uma vez que a ideia reiterada pela câmera tremida já estava bem sedimentada na narrativa.

Além do mais, Ross optou por editar as lutas de forma a impossibilitar qualquer identificação do que está acontecendo, o que tira a tensão de diversas cenas. Não que fosse necessário escancarar a violência - não era - mas a edição é confusa e rápida demais exatamente nos momentos mais tensos, em detrimento ao próprio filme.

De toda forma, Jogos Vorazes é um ótimo filme de ação, com um roteiro enxuto que faz sua duração de 142 minutos passar voando. As atuações do casal principal são muito boas, passando a exata medida de indignação, perplexidade e inocência. O elenco mais experiente parece estar se divertindo muito, especialmente Stanley Tucci e Woody Harrelson. E eu não podia deixar de lembrar de Donald Sutherland, basicamente fazendo uma ponta como o maligno Presidente Snow: esse ator é um show e sua atuação nos próximos filmes (que, considerando a bilheteria absurda que o filme está fazendo, virão, podem ter certeza) promete ser sensacional.

Mais sobre o filme: IMDB, Rotten Tomatoes, Box Office Mojo e Filmow.

Nota: 8,5 de 10

3 comentários:

  1. Amei sua crítica. Agora fiquei interessada em ver o filme...

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  2. Antes eu não esperava nada desse flme, mas a critica tá elogiando bastante. Irei conferir hoje!

    http://cinelupinha.blogspot.com.br/

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  3. concordo muuuito com sua critica abordando um elemento que conduz o filme em muitas partes:a "manipulaçao da comunicação" tendo aqueles lances dos "paraquedas" com coisas super necessárias, que achei muito show da parte da imaginação da autora , so fiquei um pouco incomodada com a estrutura muito reduzida do romance, parecendo um romance muito forçado, não muito real da parte da Katniss, parecendo que ela so construiu esse romance para vencer, mas você mudou meu ponto de vista sobre o assunto do romance, achei que você soube colocar muito bem em poucas palavras o porque dessa redução - "E o romance adolescente teve sua presença reduzida para a medida exata, tornando o personagem de Katniss ainda mais crível do que no livro.". bom muito obrigado por me fazer compreeder esse ponto. :D

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Pensem antes de escrever para escreverem algo com um mínimo de inteligência. Quando vocês escrevem idiotices, eu apenas me divirto e lembro de Mark Twain, que sabiamente disse "Devemos ser gratos aos idiotas. Sem eles, o resto de nós não seria bem sucedido."