segunda-feira, 21 de maio de 2012

Crítica de filme: Cave of Forgotten Dreams (A Caverna dos Sonhos Perdidos)

Sempre fui fascinado por pinturas rupestres. Faz parte de meu planejamento de vida um dia arrumar tempo para peregrinar por algumas cavernas no Brasil e no exterior, especialmente na França, para testemunhar, com meus próprios olhos, essa belezas pré-históricas. Para mim, tudo começou quando, ainda pequeno, vi fotos da belíssima caverna de Lascaux, no sudoeste francês. Naquela época, eu ainda queria ser arqueólogo e/ou paleontólogo e ler tudo sobre dinossauros e homens da caverna era meu passatempo favorito. Cresci e fui para uma profissão que não poderia ser mais distante dessas duas mas, lá no fundo, bem no fundo mesmo, eu ainda gostaria de ser pesquisador, mesmo hoje em dia.

Por essa razão foi que fiquei com o coração pequeno quando soube, lá pelos idos dos anos 90, que um fungo terrível havia atacado a caverna de Lascaux que já estava fechada para visitação em razão do gás carbônico expelido pelos visitantes que também havia passado a destruir as pinturas décadas antes. Em compensação, foi com enorme alegria que acompanhei, em 1994, a descoberta, por espeleólogos franceses, da caverna de Chauvet, também lá pelo sudoeste da França. O mais impressionante da caverna, tomada de pinturas pré-históricas como Lascaux, é que tais pinturas datam de 30 a 32 mil anos atrás, ou seja, mais ou menos 13 mil anos antes das pinturas de Lascaux. Além disso, os detalhes das obras em Chauvet conseguem ser mais impressionantes ainda.

Outra característica interessante de Chauvet é que a entrada natural da caverna sofreu um desabamento há milhares de anos e, por isso, o interior permaneceu absolutamente intacto por muito, muito tempo, sendo achado em 1994 por uma entrada lateral, muito escondida na floresta. Como o governo francês já havia aprendido com Lascaux, decidiu só permitir a entrada de cientistas e, mesmo assim, na base do "conta-gotas", tudo para evitar a deterioração das pinturas. Além disso, passarelas de metal foram construídas respeitando cada contorno da caverna, de forma que nem mesmo os cientistas podem estragar inadvertidamente alguma coisa.

Corta para 2009.

Naquele ano, eu soube que Werner Herzog estava terminando a produção de um documentário sobre Chauvet, já que ele havia convencido o governo francês e lhe dar um acesso sem precedentes à caverna. E a ideia era filmar em 3D.

Três longos anos se passaram e eu finalmente consegui ver o resultado: A Caverna dos Sonhos Perdidos. Herzog traz à tona algo que apenas uma meia-dúzia de pessoas no mundo conseguiu testemunhar e as imagens são estupendas, de fazer o queixo cair. Herzog conseguiu, na verdade, um milagre. Primeiro, o acesso era limitado a poucas horas por poucos dias durante poucas semanas. Segundo, quase ninguém podia entrar e, além disso, o "espaço para manobras" lá dentro era circunscrito às tais passarelas. Assim, além de narrado por Herzog, o filme também mostra o diretor diversas vezes, sendo quase que um making of do próprio filme. Mas isso acaba funcionando muito bem pois mostra o grau de dificuldade do diretor e como ele consegue dar um jeitinho para tudo sair como planejou.

Em determinado momento, por exemplo, ficamos sabendo que a única figura humana na caverna é uma mistura de mulher com uma vaca (ou o animal da época semelhante à vaca) mas conseguimos ver apenas uma parte do desenho já que a outra parte está inacessível para a câmera. Herzog não se faz de rogado e coloca a câmera em uma grua improvisada e nos mostra o que está escondido.

E o 3D não foi feito apenas para surfar na moda atual. Acontece que os artistas pré-históricos usavam a curvatura da superfície das paredes da caverna como parte do desenho e, assim, é importante destacar esse aspecto. O 3D é a resposta natural e consegue exatamente isso: permitir que apreciemos essas curvaturas em detalhes, deixando às escâncaras o brilhantismo de nossos antepassados. Com isso, A Caverna dos Sonhos Perdidos junta-se a Avatar, Pina e A Invenção de Hugo Cabret no clube dos filmes que realmente justificam a existência do 3D.

Mas o documentário, infelizmente, não é sem defeitos. O primeiro deles é pessoal: o filme é curto (apenas 90 minutos) e, mesmo assim, Herzog acaba mostrando relativamente muito pouco da arte no interior da caverna. Por mim, eu ficaria assistindo só as pinturas passando na minha frente por 90 minutos. Mas Herzog - e aí vem o segundo problema - acaba tentando explicar as motivações por detrás da pinturas, entrevistando pesquisadores de Chauvet e outros cientistas. Acaba que ele não consegue extrair nenhuma informação realmente relevante de ninguém. Por último, Herzog nos traz um epílogo completamente lisérgico, envolvendo jacarés albinos (sim, isso mesmo) em uma espécie de reserva ambiental de uma usina nuclear próxima à caverna. Tentei encarar isso pelo lado ecológico da coisa mas devo confessar que a ligação dessas cenas com a caverna, para mim, foi inexistente e, portanto, completamente desnecessárias.

De toda maneira, ainda que A Caverna dos Sonhos Perdidos não seja um primor de documentário, ele merece ser visto por qualquer um que aprecia a arte, especialmente aqueles que, como eu, são fascinados com pinturas rupestres.

Mais sobre o filme: IMDB, Rotten Tomatoes, Box Office Mojo e Filmow.

Nota: 8 de 10

Um comentário:

  1. Poxa, tua crítima me deixou com a maior fissura de ver o filme. Também amo pinturas rupestres. Inclusive, faz parte do conteúdo da disciplina que leciono. Não sabia que o Herzog tinha feito este documentário. Interessante. Vou tentar ver. Abraços!

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Pensem antes de escrever para escreverem algo com um mínimo de inteligência. Quando vocês escrevem idiotices, eu apenas me divirto e lembro de Mark Twain, que sabiamente disse "Devemos ser gratos aos idiotas. Sem eles, o resto de nós não seria bem sucedido."