Jogos Vorazes é o primeiro livro de uma trilogia escrita pela autora americana Suzanne Collins, que continua com Em Chamas (Catching Fire) e termina com A Esperança (Mockingjay), todos já publicados no Brasil. O esperadíssimo filme baseado no primeiro livro estréia mundialmente hoje e, com toda a expectativa em volta disso, resolvi ler a trilogia, apesar das obras serem para adolescentes e eu já ter passado dessa fase há muito tempo.
Devo dizer que não me arrependi. A trilogia é muito bem pensada e escrita de maneira prática, sem muitas invencionices. O que mais me surpreendeu, no entanto, foi o crescendo da série, que começa com uma premissa já bastante surrada e acaba fortemente politizado, distante até do começo mais "cinematográfico", algo que, na verdade, desagradou muitos dos jovens que esperavam um final (do terceiro livro) mais, digamos, hollywoodiano.
Mas meus comentários, hoje, ficarão restritos ao primeiro livro, ainda que o conhecimento de toda a trilogia tenha feito eu apreciar mais o primeiro livro.
A base da trama é um futuro distópico em que os Estados Unidos se esfacelaram e, no lugar dele, surgiu um país chamado Panem (quem adivinhar o porquê desse nome sem ter lido os livros ganha um doce), dividido em 12 Distritos mais a Capital. Há 74 anos, uma rebelião frustrada, que levou à total obliteração do 13º distrito, fez com que a Capital criasse os Jogos Vorazes que, nada mais são do que uma versão moderna dos jogos gladiatoriais romanos. A diferença é que cada Distrito tem que oferecer, anualmente, dois tributos: um menino e uma menina, entre 12 e 18 anos. Os 24 participantes, então, são levados para uma arena gigantesca e têm que lutar até que apenas um esteja vivo.
Essa trama soou como algo que vocês conhecem? Bom, espero que sim. Suzanne Collins muito claramente bebeu de obras seminais como "1984" de George Orwell, "O Jogo Mais Perigoso" de Richard Connell e "O Senhor das Moscas", de William Golding. Para aqueles que nunca ouviram falar nesses livros, façam um favor a vocês mesmos e procurem-nos para ler. Mas Suzanne Collins, apesar de negar, também certamente bebeu de obras mais recentes como a japonesa "Battle Royale", de Koushun Takami e a americana "The Running Man", de Stephen King, ambas adaptadas para o cinema.
De toda forma, a familiaridade da trama não deve afastá-lo da leitura de Jogos Vorazes. Primeiro porque Suzanne Collins tem um plano maior. O primeiro livro trata da competição que descrevi mas as consequências vão muito além, abrindo enormes horizontes que são tratados adequadamente nos livros posteriores. Segundo porque, muito além da violência que parece gratuita (não é), a autora quer nos contar, lá no fundo, sobre os malefícios da guerra e, tenho para mim, especialmente sobre a influência sobre as pessoas da manipulação dos meios de comunicação em geral. Os Jogos Vorazes nada mais são do que ferramentas de controle de um estado fascista, que explora seus 12 Distritos para que os habitantes da Capital vivam no luxo. Mas os jogos não seriam nada sem o poder da televisão filmando cada momento dos jogadores antes, durante e depois da competição. O objetivo é mostrar que a Capital controla com mão de ferro o país e que qualquer rebelião será massacrada. Mais para frente, nos livros seguintes, a temática do poder da manipulação da comunicação torna-se ainda mais forte e presente, ao ponto de determinadas cenas serem até ridículas e inverossímeis em um primeiro momento, mas que, em um segundo, considerando que vivemos em um mundo que dá audiência para coisas como Big Brother e programas semelhantes, são perfeitamente razoáveis.
Eu contei sobre a ideia geral do livro mas tenho que comentar sobre um aspecto específico: Katniss Everdeen, a adolescente de 16 anos que, em circunstâncias muitos especiais e comoventes, acaba nos Jogos Vorazes. A menina é uma caçadora que foi ensinada por seu pai falecido a se virar sozinha desde cedo. Com a mãe em estado quase catatônico (por causa da morte do marido há alguns anos), coube à ela largar de lado os poucos anos em que ela poderia aproveitar a infância e, com sua habilidade em flechar animais (algo ilegal nesse mundo) e de negociá-los no mercado negro, alimentar a família, especialmente sua adorada irmã Primrose (Prim, para os íntimos). Katniss é um personagem que só na superfície parece simples, raso. Fica claro logo no início que ela é especial, com habilidades que poucos têm. Sabemos instintivamente (até porque o livro é narrado em primeira pessoa por Katniss) como deve acabar a estória. Mas, debaixo da camada de clichês, existe um personagem difícil, cheio de conflitos e, em última análise, até mesmo difícil de se simpatizar.
Isso sem falar nos conflitos de Katniss com diversos outros personagens, especialmente Gale (o parceiro de Katniss na caça), Peeta (o tributo masculino do Distrito 12) e Haymitch Abernathy, campeão do 50º Jogos Vorazes e mentor por obrigação de Katniss e Peeta. Diria que, para um livro vendido como sendo para o público adolescente, ele é bem mais complexo - e mais violento - que muita coisa disponível por aí. É só saber olhar por debaixo do verniz cinematográfico que a autora espertamente soube espalhar sobre a trama.
Aliás, é o verniz cinematográfico que emperra o livro em alguns momentos. Para começar, Collins faz de tudo para justificar as mortes infligidas por Katniss durante os jogos, tudo para mostrar que ela não é uma assassina fria. As saídas que Collins arranja são competentes e não prejudicam tanto o livro mas fiquei pensando se, em situação semelhante, alguém como Katniss, acostumada a caçar todos os dias para sobreviver, deixaria de matar alguém com o mesmo propósito de sobreviver. O outro aspecto "cinematográfico" que me pegou de surpresa e acabou me deixando um pouco desapontado foi o final "surpresa", com a apresentação do último desafio na arena. Até aquele momento, o aspecto de ficção científica era muito discreto no livro mas a porta é escancarada desnecessariamente no final, deixando um gosto ruim na boca.
De toda forma, se você gosta do gênero e quer um passatempo rápido mas muito interessante, escrito de maneira competente (pelo menos no original, não posso falar nada da tradução para o português), então talvez Jogos Vorazes seja uma boa opção. O único problema que você terá será conseguir largar o livro antes de acabar a última página do terceiro volume.
Nota: 7,5 de 10
Gostaria de saber se vc tambem e Metido a Cineasta sr. Metido a Critico?
ResponderExcluirComecei, li algumas páginas e confesso que não estava animado pra ler o resto, mas sua crítica (mais uma vez, agora saindo do Cinema e partindo pra Literatura) me fez ter vontade de ir atrás. E é o que eu vou tentar fazer antes de ver o filme, terminar o primeiro volume.
ResponderExcluirExcelente texto!
Abraço.
Leia pois vale a pena!
ExcluirO nome é Panem por causa da frase em latim "panem et circenses" mais conhecida com "pão e circo", estou esperando meu docê.
ResponderExcluirBingo! Ganhou um doce virtual...
Excluirolá, assisti o filme recentemente e fiquei um pouco interessado no livro.
ResponderExcluirgostaria de saber se o livro tem mais "romance" que o filme.por que foi a única coisa que eu nao gostei do filme
Tem mais "romance" mas a situação é diferente de um romance comum. Não há nada que atrapalhe quem prefere mais ação. Pode ler tranquilo.
ExcluirEle tem "romance" sim.. Porém o livro ele trata de guerras, revolução, revoltas, ele é mais voltado para isso do que para o triângulo amoroso entre katniss e os outros dois.. Suzzana Collins ela meio que mostra nossa realidade nos livros enfim se você ler tenho certeza que vai gostar.. Muitos vão achar a esperança clichê mais relembrando ele é um livro que fala sobre revolução e guerras e não tem como ter um final feliz.. ����
ExcluirGostei muito da crítica sóbria e saborosa, os questionamentos levantados foram bem pertinentes. Claro que não posso deixar de dizer que concordo quando você disse que " O único problema que você terá será conseguir largar o livro antes de acabar a última página do terceiro volume." Eu realmente não consegui sequer dormir antes de terminar o último livro ás quatro da manhã (hahaha).Respondendo a Vinícius, o livro é mais detalhista quanto a confusão de sentimentos que há no relacionamento entre Katniss e Peeta, mas não deixa nada de graça e o romance interage de forma inteligente com a trama. Te garanto que vai ser muito difícil se decepcionar com a tradução brasileira. Esta realmente com uma qualidade incrível. Eu recomendo!
ResponderExcluirQue bom que você gostou. Realmente, largar os livros é missão difícil. Ainda bem que eles não são muito grandes e a leitura é fácil, fluida.
ExcluirSó mais uma coisa, quando sai um novo comentário específico para os outros dois livros? :)
ResponderExcluirRealmente não sei. Não planejava ler todos os livros de uma vez. Fiz anotações do que achei dos outros dois mas a ideia era publicar antes dos próximos filmes mas estou achando que vou acabar me esquecendo de detalhes dos livros...
ExcluirBem, o que posso fazer é esperar, pelas próximas críticas. Estou ansioso,mas enquanto isso, vou conhecendo o restante do blog!
ExcluirPor favor, poste as críticas! Eu acabei de ler a trilogia (faz 3 dias que não durmo) estava adorando, e o final é completamente horrivel! Teve um climax ótimo, mas o desfecho deixou a desejar.. Enfim, como esse post é dedicado ao primeiro, e eu nao posso ficar 'spoilando' aqui, seria legal você postar.. Antes que esqueça. hehe Seria legal discutir com pessoas que tem algum carater critico ao inves de ficar só no 'eu gostei'.. Enfim, eu acho que pessoalmente, só discordo de você quanto ao que as pessoas não gostaram do final por esperar algo mais hollywoodiano.. Ela estragou o final mesmo, porque parece que durante a trilogia toda ela luta por uma 'igualdade' algum 'ideal', que no final ela é meio que obrigada a voltar a vidinha dela. O que mais dá raiva é que durante toda história ela fica puta por estar sendo manipulada, e no final ainda jogam na cara dela que ela não tem mais importancia, e talvez a chamem de volta se precisarem.. (eu não ia spoilar, mas duvido que vão ler, então é isso ae)
ExcluirSua crítica é muito pertinente! Até parece com a nossa realidade, ou seja, não adianta lutar, não adianta gritar, a igualdade nunca chegará!
ExcluirO livro incentiva a competição entre os adolescentes, e uma literatura de cunho violento paro publi alvo que atinge. Não recomento a leitura para adolescentes....
ResponderExcluirPor favor, não venha dizer isso, já observou os jovens de hoje em dia? Estão muito piores, a história é fictícia e os adolescentes não são tão fracos em raciocínio para querer matar uns aos outros, não tem nexo o seu comentário
Excluirpalmas para você que não leu o livro e acha que entendeu alguma coisa ¬¬' sem ofenças
Excluir- Se incentiva ou não entre a competição entre adolescentes, isso eu não posso dizer com sinceridade, mas eu imagino que pessoas ignorantes assim, sequer podem ler um livro para imitá-los. A maldade vem da gente, não de uma história que relata a maldade... Pronto, falei, porque não acho q o livro ou o filme instigam á violência
ExcluirRespeito a opinião mas não concordo. Pica Pau e Tom e Jerry, então, também influenciariam a violência entre jovens? E Lord of the Flies, que é leitura obrigatória para os adolescentes (pelo menos em minha época era)? Tenho para mim que filmes não influenciam comportamentos. É uma questão de criação e controle dos pais, algo que cada vez vemos com menos intensidade...
ResponderExcluirconcordo, por que depois, pessoas que não leram o livro e não entederam o sentido da história, vem falar que "não recomendam o livro para adolescentes". Só digo que o livro É direcionado para o público juvenil, e que as pessoas que leram o livro(ou que leem livros) já tem uma mentalidade mais elevada para tratar de assuntos desse tipo.
ExcluirEu sinceramente gostei do livro. Tenho 15 anos e já li todos os livros da trilogia. Acho que a crítica que Jogos Vorazes faz é bem mais profunda, e chega a "enfiar o dedo" na parte mais fria do ser humano. O final da saga pode ser até menos do que o esperado, mas completamente digno do contexto e da própria personagem.
ResponderExcluirLi o primeiro e agora estou lendo o segundo. A critica aguçada a sociedade e aos problemas reais é incrível, com uma base socióloga de Marx, Engels e companhia. É claro como a luz, ver que panem na verdade é o nosso mundo sendo Eua e Europa a capital o distrito 1 com que todas as riquezas produzidas nos outros paises vão parar. Amei os livros porque mostra de uma forma bruta a realidade. Como Marx acreditava, o catalismo não é evolutivo, tendo o seu fim drástico. O futuro que contem no livro, não está muito longe de nos. Vá para a africa, e países não-desenvolvidos que irá encontrar o distrito 12. O romance e os jogos são a mascara cômica que o livro poderia ter para chegar ao lugar que chegou. Ninguem gosta de ir contra o sistema, princialmente os eua, e para um jovem ler aquilo e pensar na realidade é sois tempos. Claro alguém sensato.
ResponderExcluirsta saga, que só poderia ser escrita por alguém com a sensibilidade de Suzanne Collins, leva seus leitores, jovens ou um pouco mais velhos, a pensar no seu papel na sociedade e no relacionamento que pode ser estabelecido com o ente estatal. A saga da caçadora do Distrito 12 apresenta-nos um governo que se imiscui em todos os aspectos da vida das pessoas, que controla todos os meios de produção e as massas através do medo e do desdém pelo valor da vida humana (em especial no momento mais especial e delicado, que é o da transição da infância para a vida adulta), tal quais sempre fizeram e fazem os governos fascistas e socialistas. Isto comprovadamente é algo que deve ser combatido, e a história vem demonstrando que governos assim sempre trouxeram os piores males à humanidade (União Soviética, Alemanha Nazista, China, Camboja, Cuba, Venezuela, Coréia do Norte, etc). Esta narrativa pode ser útil para educar a juventude, e evitar que tal cenário aterrador venha a se formar. Mais do que apenas uma distopia, Jogos Vorazes é quase uma previsão do futuro, inclusive para o Brasil, caso nada seja feito, e logo, contra a esquerdalha que tomou o poder espalhando mentiras de todas as formas possíveis.
ResponderExcluirAssisti o primeiro filme e gostei. Ontem, aconteceu uma situação que eu teria que passar a noite acordado, e comprei o Livro "Em Chamas"... Li até a pagina 300... Leitura fácil e envolvente. MARAVILHOSO!
ResponderExcluirRecomendo@
Eu assisti o filme e gostei e queria saber mais sobre o livro e queria fazer uma pergunta...O livro é mais tranquilo do que o filme?
ResponderExcluirNavegando pela net me deparei com uma promoção do box desta saga. Em minha cabeça veio apenas: promoção, box, livros. Não pensei duas vezes em comprar. O problema é que depois, minha irmã adolescente disse que suas amigas adolescentes adoraram o livro. Aí pensei: tomei! Mas agora, lendo esta resenha, fico feliz em ter em mão um livro pra adolescentes, mas com um conteúdo mais adulto e que, aparentemente, é bom pra caramba. Jogos Mortais, digo, Vorazes, aí vou eu!
ResponderExcluirAhhh! Apenas um comentário: como um fã de mangás que sou, devo comentar que Battle Royale é fantástico!!! Torço pra que seja relançado no Brasil.
Na boa li a trilogia completa, e achei muito fraca e sem vida personagens nada carismatico, enredo fraco deixando muitas pontas soltas. Esperava mais enfim isso é isso
ResponderExcluirEsqueci de dizer alem de ser um mau livro ele é copia de batle royale. Porem se querem livros realmente otimos leiam dan brown ai sim
ResponderExcluirSó achei estranho ninguém comentar da influência romana no livro. É uma versão moderna de Spartacus.
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