Agora que estamos nos aproximando do final da 2ª temporada da bem-sucedida série The Walking Dead, estou pronto para falar da 1ª temporada. Produzida pelo excelente Frank Darabont (diretor de Um Sonho de Liberdade, À Espera de um Milagre e O Nevoeiro) e baseada na série em quadrinhos de mesmo nome criada por Robert Kirkman, a série nos conta a estória de sobreviventes de uma praga que transforma todos os habitantes da Terra (pelo menos aparentemente) em zumbis que se alimentam dos poucos que não foram afetados. A estória é contada a partir do ponto de vista de Rick Grimes, um policial de uma cidade perto de Atlanta que, logo no começo, é baleado e levado a um hospital, acordando do coma já depois que tudo foi consumido pela praga.
O começo da série, assim como nos quadrinhos, foi retirado do ótimo filme Extermínio, de Danny Boyle mas o desenvolvimento é bem diferente. O foco dos quadrinhos é o relacionamento humano e do que nós seríamos capazes de fazer se fossemos colocados em situação de desespero semelhante. Quando li que Darabont estaria envolvido (inclusive ele dirigiu o primeiro episódio, Days Gone Bye) logo fiquei muito feliz pois o diretor e produtor não é estranho ao tema, tendo tratado exatamente da mesma coisa - e de maneira magistral - em O Nevoeiro. Além disso, os quadrinhos de Kirkman não perdoam ninguém e mostram as maiores atrocidades possíveis sempre sendo cometidas pelos humanos, não pelos zumbis. Afinal, os zumbis apenas estão obedecendo ao instinto animal enquanto nós fazemos o que fazemos friamente, de caso pensado. Nos quadrinhos, os zumbis são apenas uma desculpa para impulsionar a estória, quase que como um McGuffin.
Por isso achei que a série seria irretocável. No entanto, eu me enganei seriamente. Apesar de um começo magistral, mostrando a solidão e confusão de Rick Grimes (Andrew Lincoln) até que ele acha um grupo de sobreviventes nos arredores de Atlanta, a série acaba caindo em uma armadilha ao dar muito destaque aos zumbis. Enquanto esse aspecto não fica claro no primeiro episódio (e essa temporada só teve seis episódios), logo no segundo começamos a notar que os zumbis da série são semelhantes aos zumbis de Zack Snyder na refilmagem de Madrugada dos Mortos. Em outras palavras, eles são superpoderosos e ágeis, capazes até mesmo de pular grades. Assim, os zumbis de The Walking Dead acabam se tornando ameaças muito mais sérias do que os próprios humanos do grupo sobrevivente (e outros), o que perverte completamente o espírito dos quadrinhos em que foi baseada.
Vejam que eu sou o primeiro a defender que adaptações são adaptações e elas precisam ser diferentes do material fonte. Acontece que, no caso de The Walking Dead, a importância dos zumbis para a trama é tão grande que eles abafam os conflitos e escolhas dos personagens. Não que questões interessantes não sejam levantadas. São sim, claro. Mas elas acabam sendo coadjuvantes para um cenário muito maior, que são os monstros ao redor. Ou seja, exatamente o oposto da proposta da Robert Kirman quando criou a série de quadrinhos.
Ultrapassado esse ponto, devo confessar que o andamento dos roteiros a partir do terceiro episódio também deixa a desejar. A promessa de ação dos dois primeiros episódios (com a ótima cena do tanque sendo o ponto alto) não se materializa nos três episódios seguintes. Tudo basicamente para no acampamento dos sobreviventes, só passando a andar novamente quando eles resolvem sair de lá, o que só acontece do penúltimo para o último episódio. Mas, antes da saída, ainda somos brindados com o quarto episódio, Vatos, em que vemos uma gangue gentil e angelicalmente cuidando de um asilo de velhinhos. Ok, entendi a mensagem mas não só ela ajuda a trair de vez o espírito dos quadrinhos mas, também, ela é exagerada demais, ao ponto do ridículo. É aquela ideia patética que a equipe de roteiristas deve ter jogado para lá e para cá: e se nós colocássemos um monte de bandidos do pior tipo cuidando de velhinhos? Não será uma surpresa para o espectador? Sim, pessoal, foi uma surpresa mas não exatamente pelas razões que vocês acham...
E o final apocalíptico no Centro de Controle de Doenças em Atlanta é exagerado demais, tecnológico demais para uma série que, até então, tinha seus personagens vivendo com o que conseguiam achar no meio da rua. Simplesmente não combinou. Além disso, para forçar o desfecho, os produtores nos apresentam a um personagem novo, apenas no último episódio, personagem esse que é essencial para a trama conforme o roteiro mas que, obviamente, por ser apresentado no último minuto, não foi trabalhado de maneira decente pela série. Sua presença, assim, mais parece como um mecanismo fácil para dar espetáculo aos espectadores que o querem.
Mas vejam, nem tudo se perdeu nessa temporada. No lado positivo das coisas temos o fato da série existir. Isso, por si só, já é um grande mérito. Afinal, trata-se de uma série baseada em quadrinhos extremamente gráficos e violentos. A AMC, produtora dessa série e de outras excelentes como Mad Men (1ª, 2ª e 3ª temporadas) e Breaking Bad, não economizou em imagens e ideias perturbadoras (nem poderia, aliás, pois Breaking Bad já é uma série bem perturbadora em si) e mostra tudo que precisa mostrar, sem firulas. Isso, na televisão, é um feito raro, especialmente quando o rótulo do filme será inevitavelmente o de "filme de zumbi", o que normalmente afasta uma boa parte dos interessados.
E o esmero da produção de Darabont é notável. Não só o cuidado com a caracterização dos zumbis é incrível, com maquiagens detalhadas e diferenciadas para cada um deles, como a estética e paleta de cores da série dão literalmente o tom desolador que a situação tem que passar ao espectador. Em termos técnicos, The Walking Dead teria qualidade suficiente para ser um filme de cinema, com apenas algumas alterações aqui e ali, para melhor adaptação à tela grande. E o primeiro episódio, como disse, é próximo da perfeição.
Depois do fim da 1ª temporada, Darabont anunciou seu desligamento da série. Não ficou clara a razão disso mas, como tudo em Hollywood, certamente houve um mix de dinheiro com ego (seja de Darabont, seja da AMC, pouco importa) nessa estória e isso pode significar mudanças para melhor ou para pior na 2ª temporada. Como, para mim, o estilo Darabont acabou não dando muito certo na 1ª temporada, tenho esperanças que as coisas melhorem na 2ª. Material base para isso existe em enormes quantidades. Resta saber se a produção terá coragem de diminuir a participação dos zumbis em prol da demonstração da verdadeira - e terrível - natureza humana.
Mais sobre a série: IMDB, TV.com e Filmow.
Nota: 6 de 10
Quando vc vai lançar a da 2 º, 3º e 4º temporada ?
ResponderExcluirSe já lançou, me passa o link, pois não estou achando.
Adoro suas críticas, li de todas sobre planeta dos macacos e agora quero ler sobre TWD.
Abraço, sou seu fã.
Olá! Que prazer é ler uma mensagem dessas aqui! Obrigado por esse prestígio todo.
ExcluirOlha, esse blog aqui eu larguei e migrei para um site muito bacana chamado Plano Crítico, com outros editores. Mas ainda é um site bem caseiro, só que BEM mais completo. As críticas de todas as temporadas de TWD estão lá. Convido-o a dar um pulo lá e passar a acompanhar o Plano Crítico, aqui: planocritico.com. Temos página no Facebook também: https://www.facebook.com/planocritico
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Abs, Ritter.
Obrigado por me responder Ritter, agora vou passar a visitar o Plano Crítico.
ExcluirAbraço.